por Food Magazine
26/10/2015
O setor de panificação e confeitaria é um dos mais promissores da alimentação fora do lar, apesar de estar registrando desaceleração desde 2010. O índice de crescimento em 2014 foi de 8,02%, segundo ano consecutivo que o setor apresenta uma elevação inferior a 10%, a menor taxa dos últimos oito anos. Os dados fazem parte do levantamento do ITPC (Instituto Tecnológico de Panificação e Confeitaria) em parceria com a Abip (Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria), através de pesquisa em mais de 1.200 empresas de todo o País, abrangendo representantes do setor de todos os portes.
Apesar do crescimento não ter sido tão vigoroso, o faturamento das empresas de Panificação e Confeitaria cresceu, entre 2010 e 2014, 46,5%. Somente em 2014, as cerca de 63 mil padarias presentes em todo território brasileiro receberam cerca de 41,5 milhões de clientes diários e faturaram R$ 82,5 bilhões. Por outro lado, os gastos também subiram, em média, 11,5%. Os preços dos produtos adquiridos pelas empresas de panificação no atacado tiveram um reajuste médio de 8,71%, a alta do salário médio do setor foi de 18,2%, o custo com embalagens aumentou em 13,3% e a energia elétrica 14,8%. O gasto com pessoal também subiu, de 2010 a 2014, 50,2%.
Segundo pesquisa realizada pelo Dataconsumer, 52% dos clientes que frequentam padarias têm um grau de exigência muito elevado sobre os produtos panificados. Isso torna a operação das empresas um desafio maior. Para atender a alta expectativa de seus frequentadores, elas tiveram que se reinventar. A diversificação foi a alternativa encontrada por padarias, que hoje ofertam uma variedade de produtos e serviços que vão da conveniência a refeições, uma tendência em todo país para preencher a ausência de demanda no horário de almoço. “Percebemos que muitas padarias tem se reestruturado fisicamente para chamar a atenção dos consumidores, tornando-se cada vez mais aconchegantes na procura por serviços rápidos e de extrema qualidade”, afirma Luciano Braile, diretor da Nilpan.
Estratégias para a diversificação
A diversidade de oferta de produtos nas padarias tem gerado uma necessidade de artifícios para facilitar o dia a dia, como a terceirização e a utilização de produtos prontos ou semi-prontos. Esta é uma realidade diante de profissionais especializados, além dos elevados encargos de um funcionário. “Os custos operacionais nas empresas tem subido muito acima da velocidade das vendas. Sendo assim a necessidade do aumento da produtividade é cada vez mais evidente. Vale ressaltar que o cliente está cada vez mais exigente e demandando maior variedade e frescor. Para atendê-lo, estas soluções são de grande valia, pois conseguem agilidade e produção a qualquer hora do dia, oferecendo assim alimentos frescos”, sublinha Emerson Amaral, diretor técnico do Instituto Tecnológico de Panificação e Confeitaria (ITPC).
Outro ponto é a necessidade de significativos investimentos em equipamentos de acordo com as normas vigentes, principalmente a NR12. Neste caso, a terceirização isenta deste volume de investimento inicial. Por isso, muitas empresas do setor funcionam como “ponto quente”, padarias que não manipulam nem produzem nada, apenas comercializam. “É mais fácil montar a área de vendas, pois na produção tem toda vistoria da Anvisa. Terceirizar é não ter gasto com mão de obra, equipamentos, água, luz e espaço”, ressalta Samara Trevisan Coelho, professora do curso de extensão universitária Mestre Padeiro Internacional, do Centro Universitário Senac – Santo Amaro.
Assim como algumas padarias trabalham apenas como ponto de comercialização, outras resolveram baixar as portas e somente fabricarem para abastecer estabelecimentos. Além dos produtos frescos, elas também ofertam, assim como as grandes indústrias, pães congelados, que tem se apresentado hoje como uma tendência forte e crescente. O mercado aprimorou as técnicas de congelamento e hoje oferece toda a variedade de opções, o que há algum tempo não era possível. “Há uma linha de congelados com alta qualidade. Hoje existe tecnologia para trabalhar com alta produção e ter uma vitrine sempre fresca. Temos todos os produtos da linha de padaria prontos congelados, permitido pelo avanço da tecnologia e conhecimento técnico”, diz Samara.
As misturas pré-prontas, apesar de ainda utilizar mão de obra e espaço, agilizam os processos, não exigem tanto conhecimento técnico e reduzem o número de funcionários. Existem tanto pré-misturas mais acessíveis como de alta qualidade. É possível atingir o objetivo de ter uma vitrine com variedade e qualidade através das misturas. Entretanto, o consultor Fabiano Xavier, proprietário da FX Consultoria, alerta: “Acredito que haverá crise nos ‘segmentos’ de panificação. Aqueles empresários que apostarem em diversidade maquiada, ou seja, modelos diferentes de pães feitos com a mesma massa, poderão ter queda nas vendas”
Tendências
Na contramão do desenvolvimento das padarias multifacetárias, vem ocorrendo o aumento das padarias boutique que produzem pães artesanais, especialmente em São Paulo, pois, como destaca Fabiano Xavier, as padarias modernas estão perdendo sua identidade e personalidade. “Vemos muita pasteurização, mas pouca segmentação.
Acredito que haverá um mercado muito grande para a segmentação. Pães com fermento natural, farinhas hipoalergênicas, já são realidade há décadas na Europa e Estados Unidos. Lojas de cupcakes, de pão de queijo, de brigadeiros, confeitarias voltadas somente para diet e light, padarias totalmente integrais”. Para Samara Trevisan, a oferta de produtos específicos, especialmente com apelo mais saudável, como massas sem glúten e lactose, é uma tendência, que só não é ainda mais explorado por conta de custo. “A fécula de batata, por exemplo, ideal para substituir a farinha de trigo, que custa R$2 o quilo, está R$22”, exemplifica.
Entraves legislativos
A professora do Centro Universitário Senac chama a atenção para alguns problemas enfrentados pelos padeiros e confeiteiros em relação a ausência de padronização dos rótulos dos produtos, já que a legislação brasileira é ampla e não exige uma descrição detalhada das informações técnicas. Ela explica que a porcentagem de proteína em uma farinha, por exemplo, faz toda a diferença no resultado de cada tipo de pão.
“Chocolate também tem pouca opção. Não tem uma padronização, o que acarreta na qualidade do produto final. O profissional tem que conhecer a matéria prima – com a qual está trabalhando. Lá fora é comum ter as informações detalhadas, porcentagem de cacau, de gordura, etc”.
Outra falha da legislação é a não exigência de um profissional para fiscalizar os processos, assim como em restaurantes. Para abrir uma padaria basta fazer um curso de poucas horas de manipulação de alimentos e higiene na cozinha, o que não é suficiente, na opinião de Samira. “O desafio é os empresários entenderem que não é só uma questão de investimento. O banheiro, por exemplo, não pode ficar próximo à produção devido ao risco grande de contaminação. É importante ter uma mão de obra especializada, um chef padeiro, mesmo para quem trabalha com pré-misturas, para ser responsável pela produção”, finaliza.