por Fabrício Bernardes (Istoé Dinheiro)
24/02/2015
Tomar o café da manhã numa padaria brasileira significa, na maior parte das vezes, sentar no balcão, pedir um pingado e saborear um pãozinho com manteiga na chapa. O proprietário do estabelecimento, pode apostar, vai se chamar Manoel ou Joaquim – e não esconderá sua origem lusitana. Não espere isso, no entanto, se um dia visitar uma das 217 unidades da rede de padarias Le Pain Quotidien, do belga Alain Coumont, 53 anos, espalhadas pelos quatro cantos do mundo. Sua butique de pães, que também funciona como um bistrô, opera ao velho estilo europeu – com pães variados, feitos com farinha orgânica e cheios de manteiga e geleia.
Coumont conseguiu transformar uma padaria que funcionava no centro de Bruxelas, inaugurada em 1991, com a qual mal conseguia pagar as contas, numa rede de lojas que faturou, no ano passado, estimados US$ 400 milhões. Qual a receita? Um ambiente vintage e descolado. No cardápio, uma proposta natureba. Coumont desembarcou em 2012 no Brasil, atraído pelo aporte de R$ 20 milhões de um grupo de investidores franceses e americanos. A empresa mantém quatro lojas em endereços requintados, como Vila Madalena, Itaim Bibi, Vila Olímpia e Shopping Cidade Jardim, em São Paulo – onde pretende inaugurar mais 11 unidades até 2017.
A ideia de Coumont, de produzir seus pães, sopas e doces apenas com matérias-primas orgânicas, logo conquistou seguidores. Cerca de 70% dos produtos oferecidos pela rede, segundo o empresário, são livres de agrotóxicos. “Temos uma maneira especial de produzir nossas refeições”, diz. “A intenção da Le Pain Quotidien é oferecer a comida que a nossa vó fazia, natural e livre de agrotóxicos.” O pão é feito artesanalmente com farinha orgânica e a fermentação segue em processo natural. Por isso, um único pãozinho demora, em média, 36 horas para ficar pronto.
Os fermentados quimicamente, por outro lado, levam apenas três ou quatro horas. Além do pão gourmet, têm destaque no cardápio os Tartines, sanduíches abertos típicos da Bélgica recheados com brie ou pimenta biquinho, e os vinhos italianos, argentinos e chilenos – todos orgânicos, é claro. “Só temos produtos saudáveis, por isso, não vendemos refrigerantes, por exemplo”, diz Coumont, que passa a maior parte do tempo na sede da companhia, em Nova York. “Não dá para saborear uma sopa de cenoura com gengibre tomando refrigerante.” O ambiente da Le Pain Quotidien é uma experiência à parte.
Tudo relembra a história de seu criador. Em 1989, Coumont era dono de um restaurante e estava inconformado com a baixa qualidade do pão belga na época. “Tinha de importar tudo da França”, diz. Três anos depois, Coumont abriu uma boulangerie para fabricar o pão do jeito que queria. Para decorar sua loja, o chef foi às compras num mercado de pulgas em Bruxelas e adquiriu uma mesa comunitária de madeira, daquelas usadas por costureiras em fábricas, e a colocou no centro da butique. “Não tinha muito dinheiro, comprei o que deu”, diz. Hoje, a mesa comunitária é um símbolo da marca.
Em todas as mais de 200 unidades da Le Pain Quotidien, a decoração é no estilo vintage – com móveis de madeira e com a famosa mesa comunitária no meio do salão. No Brasil, a Le Pain Quotidien fermenta seus negócios em um setor em forte expansão, de 10% ao ano, em média, e que movimentou quase R$ 80 bilhões em 2014, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria (Abip). Seu posicionamento premium, em um mercado pulverizado e carente de sofisticação, como o de panificação, é uma vantagem.
“A Le Pain Quotidien nada de braçada na frente dos seus concorrentes, em sua maioria negócios pequenos e familiares, sem qualquer apelo no mercado premium ou de luxo”, diz Patrícia Cotti, diretora do Ibevar, instituto especializado em varejo. Patrícia também destaca a vocação da empresa de oferecer aos seus clientes um lugar de convivência, assim como a gigante Starbucks, a maior rede de cafeteria do planeta. “Para isso, no entanto, é necessário oferecer atendimento qualificado, algo que normalmente as grandes redes internacionais deixam a desejar quando vêm para o País”, afirma.